sábado, janeiro 09, 2010

Não

“Queres te encontrar comigo?” – pergunta-me ele casualmente. Nessa frase curta, o predicativo do sujeito é foda. A intenção é notória ainda que camuflada. Se não te soubesse tão bem, se entre nós não houvesse caso, talvez interpretasse de outra forma. Não há espaço para outras leituras, os desejos eclipsam-se deliberadamente nos arquivos dessas antigas histórias. Tirá-los para fora, tirar-to para fora, é excitar as minhas alergias ao pó. Não quero beijos sabidos a naftalina. Registo a vontade, tomo conhecimento sem que isso me altere um milímetro o humor ou a vontade. Não te quero. No entanto, prossegues com o teu discurso “vem ter comigo cá a casa”, discorrendo em contra-resposta que “nada irá acontecer se não quiseres, se bem que aposte que vai”. Não sou uma entrega de foda ao domicílio. Como um vendedor determinado a impingir as qualidades do seu produto, verbalizas “eu sei que nos vemos pouco, são circunstâncias da vida, mas eu quero-te a ti e não o teu sexo”. Atentas à minha diplomacia e, ainda assim, controlo-me. Se assim o quisesse, se assim te quisesse, por entre os teus lençóis poderia eu ser puta. Por só obedecer à minha ordem interna, vais ter que te consolar sozinho. Não parto para te encontrar teso sem sentir as coxas apertadas pela eminência de te rever. Na ausência disso desperdiço-me em ir ter contigo.